Quando caem dos anjos

A primeira dor não é o cair das asas de leite, mas o não nos nascerem outras no lugar. A vida se faz de esperanças vãs cujos vãos preenchemos com esperanças outras, seres esperantes com algumas ações, algumas maçãs. Há dias em que o tempo tem um som — não o dos sinos ou o dos relógios mecânicos, mas um ruído contínuo a serpentear em uma superfície lisa e estar à beira de pingar ao chão. A um outro chão. Há muito rememoramos quedas que já nem são nossas... Quando caem dos anjos as asas de leite estendemos nossas mãos ao céu, esperando algo como o flutuar das painas ou um enxame de aleluias, algo que vagamente imaginamos que nos sirva — a roupa velha do irmão mais velho. Mas seguem nossas mãos vazias presas a um corpo que se prende ao chão. Que se agarra ao chão. (Os anjos, já de asas renovadas, quem sabe nos tenham inveja do nosso tempo à beira do abismo.)

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Criadora

Larissa Fonseca e Silva, 1998. Nascida em Caldas, no sul de Minas Gerais, crescida dentre livros e montanhas. Mestra em Teoria Literária e Crítica da Cultura pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ) e doutoranda em Literatura Portuguesa na Universidade de São Paulo (USP). "Crio com a ponta dos dedos, no raio do sol vejo a magia da poeira e sei que há sentido no decompor das coisas pois até os resquícios dançam." Registro e guardo aqui.