A vela queimando me lembrou a fragilidade — não sei se da cera, não sei se da chama, não sei se de mim. Sempre temos interpretações poéticas para depois que os momentos acontecem. Eu desisti dos diários porque desisti da falsa verdade contida neles, mas me lembro várias vezes ao dia de endireitar a coluna. Ou penso que me lembro só porque me lembrei agora. É frágil a verdade como a chama de uma vela que, ainda assim, consome a vela e pode queimar uma casa. Isto aqui não é um diário; são anotações que vasculho como quem separa o joio do trigo. Nesses casos, o joio é melhor do que o trigo porque é o masculino de joia e isso diz muito... E sobre os campos de trigo interessa mais é a pipa que lhe vai acima e quase alcança as nuvens. Buscar poesia é isso: separar o joio do trigo, ficar com o joio. Semear o joio. (O sustento, depois se vê.) [Caldas, 24 de outubro de 2022]